Por Pedro Verzani
Os esteroides anabolizantes (EA) são um grupo de fármacos análogos à testosterona produzidos a partir de derivados sintéticos deste hormônio. A testosterona é naturalmente secretada, principalmente pelos testículos nos homens e, em menor concentração, pelos ovários nas mulheres. Seus efeitos são androgênicos, isto é, são relacionados com as características secundárias masculinas (mudança no timbre da voz, pelos e barba, por exemplo). Além dessa função os efeitos dos anabolizantes também são anabólicos e desempenham um papel no aumento da síntese de proteínas, o que consequentemente leva a um aumento da massa muscular (hipertrofia) e da força. Somado a isso, esses esteroides também aumentam a síntese de glóbulos vermelhos (hemácias) e a deposição de cálcio nos ossos, além de diminuir as reservas de gordura no organismo [1,2,4,5].
Nesse contexto, os anabolizantes possuem diversos usos clínicos, como em lesões musculares, osteoporose e alguns tipos de anemia, mas sua principal função está relacionada à reposição hormonal de testosterona diante de alguma doença ou condição de saúde do paciente [2,5]. Os EA podem ser utilizados na forma de comprimidos, cápsulas ou também como injeção intramuscular, sendo sua dispensação permitida apenas com retenção de receita, de acordo com a Lei Federal 9.965/2000 [7]. A prescrição é realizada pelo médico para as situações indicadas, sendo indispensável a orientação e o monitoramento do uso do medicamento por profissional de saúde especializado .
Os anabolizantes são também frequentemente utilizados para fins estéticos e no esporte, devido a sua ação na hipertrofia rápida dos músculos. No entanto, este uso é proibido pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), uma vez que não há evidências suficientes sobre a dose recomendada e a segurança do uso de anabolizantes para fins estéticos ou prática de esportes [3,6,7,8].
O uso indevido dos anabolizantes é mais comum entre os jovens e adolescentes, com o intuito de ganhar massa muscular de forma rápida [8]. Diante disso, observa-se que o uso de EA é uma pauta importante a ser discutida no contexto da saúde pública. [3]
Em um estudo observacional realizado na Austrália, foi avaliada a utilização de anabolizantes entre jovens e adolescentes, com o objetivo de calcular sua prevalência e as motivações de uso de hormônios sintéticos neste público. Foram selecionados 488 adolescentes do sexo masculino de 13 a 16 anos de nove escolas australianas. Avaliou-se variáveis demográficas (relação do uso com a localização geográfica), insatisfação com gordura corporal e musculatura, internalização da musculatura ideal (busca pelo corpo musculoso), participação em esportes e musculação. Nesse cenário, também avaliou-se o grau de insatisfação corporal, utilizando uma escala – Escala de Atitudes Corporais Masculinas (MBAS), junto a subescalas que avaliavam a relação da insatisfação corporal com a musculatura e o teor de gordura corpórea. Como também, os jovens participantes da pesquisa foram questionados a respeito da frequência da prática de exercícios físicos e esportes e do uso de anabolizantes nos últimos meses. Dessa forma, a partir de um estudo de todas as variáveis, os autores observaram que, nos últimos três meses, 12,7% dos participantes utilizaram os esteroides no intuito de melhorar a performance na musculação, principalmente relacionados à aparência (insatisfação corporal) e ao desempenho físico. [10]
O uso de esteroides, quando administrados sem uma orientação clínica, pode potencializar os efeitos adversos. Um desses efeitos é o aumento na produção de glóbulos vermelhos (hemácias), o que promove aumento da viscosidade do sangue e torna mais provável a ocorrência de hipercoagulabilidade sanguínea, podendo levar o indivíduo a um quadro de trombose [8]. Outros efeitos adversos decorrentes do uso de anabolizantes são: nervosismo, irritação, agressividade, problemas hepáticos (fígado), acnes, problemas sexuais e cardiovasculares, retenção de líquidos, aumento da pressão sanguínea, entre outros [2,6].
Vale mencionar que alguns efeitos adversos são ainda específicos para os sexos masculino e feminino. Para o homem, o uso inadequado pode acarretar diminuição do volume testicular, redução na formação de espermatozoides (podendo levar à infertilidade), calvície, desenvolvimento de mamas, dificuldade para urinar e principalmente o aumento da próstata (hiperplasia), o que pode ser uma condição de risco para desenvolvimento de câncer prostático. Por outro lado, o uso pela mulher pode ocasionar crescimento de pelos, alterações no ciclo menstrual, aumento do clitóris, alterações na voz (voz grave) e atrofia do tecido mamário. [6]
Um estudo avaliou dados sobre as drogas apreendidas pela Polícia Civil de Minas Gerais entre 2017 a 2022, incluindo os esteroides anabolizantes. Os dados levantados foram baseados na submissão das amostras para análise laboratorial forense, a fim de identificar o princípio ativo desses medicamentos e compará-los com o descrito no rótulo de suas formas farmacêuticas (embalagem). Foram analisadas 265 amostras de esteroides androgênicos de acordo com a regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Dos 47 tipos diferentes de anabolizantes disponíveis como amostra, apenas 16 são autorizados e regulamentados pela Anvisa. Sendo assim, com o aumento da adesão do uso de anabolizantes esteroides, aumentam-se os riscos associados a efeitos adversos, já que muitos daqueles que são usados, não são recomendados e regulamentados pela Anvisa. [12]
Nesse contexto, torna-se evidente que o uso adequado dos anabolizantes é essencial para a minimização de efeitos adversos e doenças relacionados ao uso. Desse modo, é de suma importância o acompanhamento médico e farmacêutico para análise do quadro clínico do paciente e prescrição, se necessário. [5]
Referências:
[1] Biblioteca Virtual em Saúde, Ministério da Saúde. Anabolizantes. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/anabolizantes/
[2] Secretaria da Educação. Drogas – Informações Gerais – Tipos: Esteroides Anabolizantes. Disponível em: http://www.quimica.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=264
[3] Alisson Padilha de Lima, Fabrício Bruno Cardoso. Alterações Fisiológicas e Efeitos Colaterais Decorrentes da Utilização de Esteroides Anabolizantes Androgênicos. Revista Brasileira de Ciências da Saúde. 2011 Nov 21. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/dezembro2013/ed_fisica_artigos/alteracoes_fisiologicas.pdf
[4] Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid). Esteróides anabolizantes. Disponível em: https://www2.unifesp.br/dpsicobio/cebrid/quest_drogas/esteroides_anabolizantes.htm#:~:text=Eles%20ajudam%20no%20crescimento%20dos,produzem%20quantidade%20suficientes%20de%20Testosterona.
[5] Universidade Federal de Alfenas (Unifal). Uso de esteroides anabolizantes. Disponível em: https://www.unifal-mg.edu.br/portal/2023/06/07/uso-de-esteroides-anabolizantes-conheca-as-consequencias-do-uso-indevido-desses-hormonios-para-fins-esteticos-em-entrevista-com-coordenadora-do-projeto-se-e-bomba-um-dia-ela-estoura/
[6] Paulo César Pinho Ribeiro. O uso indevido de substâncias: esteroides
anabolizantes e energéticos. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/dezembro2013/ed_fisica_artigos/uso_indevido_substancia.pdf
[7] Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: http://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-cfm-n-2.333-de-30-de-marco-de-2023-476034798
[8] Uso excessivo de anabolizantes pode causar trombose, hipertrofia do coração e hepatite. Jornal da USP. Disponível em: https://jornal.usp.br/radio-usp/uso-excessivo-de-anabolizantes-pode-causar-tr0ombose-hipertrofia-do-coracao-e-hepatite/
[9] Quando o uso clínico dos esteroides anabolizantes é permitido pelo CFM?. Sanar. Disponível em: https://www.sanarmed.com/quando-o-uso-clinico-dos-esteroides-anabolizantes-e-permitido-pelo-cfm-colunistapremium
[10] Olivia Piplios, Zail Yager, Siân A. McLean, Scott Griffiths, Jo. R. Doley. Appearance and performance factors associated with muscle building supplement use and favourable attitudes towards anabolic steroids in adolescent boys. frontier in Psychology. Sep 8 2023. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10516554/
[11] Beatriz Vieira Castilho, Luciana Pereira Ruela, Luisa Marciano Grasselli,Yasmin Teixeira Nunes, Cláudio Daniel Cerdeira, Gérsika Bitencourt Santos, Alexandre Ponciano. Esteroides anabolizantes androgênicos: conscientização sobre uso indiscriminado, utilização na terapêutica e relação risco-benefício. Vittalle. Disponível em: https://periodicos.furg.br/vittalle/article/view/12726/9156
[12] Fabiana de Moura, Mariana C. C. Diniz, Yuri Machado, Cláudia D. R. Ricoy, Evandro Piccin. Overview of the seized and examined pharmaceutical in the state of Minas Gerais-Brazil by the Civil Police from 2017 to 2022: A fundamental analysis of the recent impact over the drugs market. Forensic Journey of Sciences. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1556-4029.15265
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