Medicamentos para diarreia: entender as causas para fazer uma boa escolha

Laura Fonseca (atualização: 09/11/2023)
Por Rafaela J M de Santana (texto original: 21/11/2013)

Diarreia é a ocorrência de três ou mais evacuações líquidas ou semilíquidas em quantidade moderada ou grande em 24 horas1. Pode ser crônica (duração superior a duas semanas), como na intolerância à lactose e na Síndrome do Intestino Irritável, ou aguda (duração inferior a duas semanas), sendo esta causada por agentes infecciosos, fármacos ou toxinas2. A diarreia aguda não específica geralmente é benigna e autolimitada, sendo a desidratação o maior risco envolvido.  A terapia de reidratação oral constitui uma medida essencial, enquanto medicamentos antidiarreicos, quando indicados, reduzem os sintomas e encurtam o incômodo experimentado pelo paciente, permitindo que ele retorne mais rapidamente à suas atividades normais3.

Fonte: Google Imagens

Fonte: Google Imagens (adaptada)

Ao procurar por antidiarreicos nas farmácias e drogarias, os antigos consumidores devem se perguntar onde estão a Ftalomicina® (ftalilsulfatiazol + hidróxido de alumínio), o Kaomagma® (associação de caulim, pectina e hidróxido de alumínio), ou xarope à base de loperamida, medicamentos que já foram tão indicados para a diarreia.  Em 1994, a Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde (antecessora da Anvisa) instituiu portaria4 proibindo a produção e comercialização de 73 antidiarreicos, muitos deles de uso popular consagrado. A razão foi ineficácia e a possibilidade de provocar efeitos adversos graves, incluindo óbitos, como o caso dos opiáceos (difenoxilato e loperamida) em formas farmacêuticas líquidas para uso pediátrico. Também foram cancelados os registros de associações de antimicrobianos com substâncias anticolinérgicas, caulim, pectina e atapulgita, isolados ou associados entre si e com indicação antidiarreica. Essa medida contribuiu para a diminuição das opções terapêuticas irracionais no mercado, aumentando a segurança no uso dessa classe de medicamentos5.

Os medicamentos destinados ao tratamento da diarreia disponíveis atualmente podem atuar sobre os microrganismos que causam a diarreia ou sobre o trato intestinal, diminuindo a motilidade ou a secreção ou alterando a sua flora. Os medicamentos que diminuem a motilidade intestinal (loperamida, Imosec®) devem ser evitados nas diarreias causadas por microrganismos ou toxinas, pois podem retardar a eliminação dos mesmos e propiciar invasão sistêmica. Os antissecretórios (racecadotril, Tiorfan®) influenciam na excreção de eletrólitos e não na motilidade6. Os probióticos (S. boulardii, Floratil®) são suplementos microbianos que contribuem para a restauração do equilíbrio microbiano intestinal, prevenindo problemas digestivos e competindo com bactérias nocivas para inibir infecções. Eles fortalecem o sistema imunológico intestinal, promovendo defesas naturais, e produzem substâncias benéficas que melhoram a saúde do intestino e a absorção de nutrientes. Estudos sugerem que a Saccharomyces boulardii reforça a barreira intestinal, reduzindo permeabilidade e evitando a passagem de toxinas para a corrente sanguínea7,8.

Em acordo com o Ministério da Saúde, o manejo das diarreias envolve a reidratação oral, objetivando o tratamento da desidratação, e uma dieta composta por alimentos de fácil digestão. Probióticos podem ser recomendados para restaurar o equilíbrio da flora intestinal, enquanto medicamentos antidiarreicos não são recomendados, devido à interferência na eliminação de toxinas de possíveis patógenos. Tratamentos específicos são direcionados conforme a causa subjacente, como antibióticos para infecções bacterianas. A avaliação médica é aconselhada para casos graves, especialmente em grupos vulneráveis9.

A compreensão das causas da diarreia facilita a escolha correta para o tratamento eficaz desse sintoma, que mesmo sendo em grande parte dos casos autolimitado e benigno, impacta as atividades diárias e pode levar os pacientes a absenteísmo ao trabalho e à escola, com impacto na vida social e econômica10.

Referências
  • 1 World Health Organization. The Treatment of diarrhoea: a manual for physicians and other senior health workers. 4th rev. Geneva: WHO Library Cataloguing: 2005.
  • 2 Farthing M, Lindberg G, Dite P, Khalif I, Lindo ES, Goh K, Thomson A, Khan AG. Guia prático da Organização Mundial de Gastroenterologia: Diarreia Aguda. 2008.
  • 3 Kaplan MA, Prior MJ, McKonly KI, DuPont HL, Temple AR, Nelson EB. A Multicenter Randomized Controlled Trial of a Liquid Loperamide Product Versus Placebo in the Treatment of Acute Diarrhea in Children. Clin pediatr. 1999; 38:579-591.
  • 4 Brasil. Ministério da Saúde. PORTARIA Nº 106, DE 14 DE SETEMBRO DE 1994. [internet]. [acesso em 2013 set 02]. Disponível em  http://www.brasilsus.com.br/legislacoes/svs/15134-106.html
  • 5 Costa ARV, Carvalho PM, Souza ESM. Medical and social repercussion of the governamental prohibition of selling of antidysenterics. Rev bras ciênc saúde. 1998; 2(1/3): 43-8.
  • 6. Brunton LL, Lazo JS, Parker KL. Goodman e Gilman: As bases farmacológicas da terapêutica. 11 ed. Porto Alegre: AMGH; 2010.
  • 7 Kim SK, Guevarra RB, Kim YT, Kwon J, Kim H, Cho JH, Kim HB, Lee JH. Role of Probiotics in Human Gut Microbiome-Associated Diseases. J Microbiol Biotechnol. 2019 Sep 28;29(9):1335-1340. doi: 10.4014/jmb.1906.06064. PMID: 31434172.
  • 8 Wilkins T, Sequoia J. Probiotics for Gastrointestinal Conditions: A Summary of the Evidence. Am Fam Physician. 2017 Aug 1;96(3):170-178. PMID: 28762696.
  • 9 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manejo do Paciente com diarreia [Cartaz]. 2021. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/cartazes/manejo_paciente_diarreia_cartaz.pdf. Acesso em: 4 ago. 2023. 
  • 10 Moraes E, Chinzon D, Coelho LG, Fernandes TF, Haddad  MT. A multicentric, randomised, investigator-blind, parallel group study to assess the efficacy, safety and tolerability of Racecadotril versus Saccharomyces boulardii in the treatment of acute diarrhoea in adults. Rev bras med. 2001; 58(1/2):65-74.

Da prevenção ao tratamento: a evolução dos medicamentos para asma e como eles ajudam a controlar a doença

Por Bruna Michelly Silva Cordeiro e Izabella Guerra

A asma é uma doença que tem sido registrada ao longo da história da humanidade. No antigo Egito, os médicos a descreviam como uma doença que causava falta de ar e tosse, na qual eles chamavam de “pescoço apertado”.1 Nesse período, havia disponível uma variedade de tratamentos para alívio dos sintomas, incluindo misturas de ervas e massagens na região torácica.1 

Na Grécia antiga, Hipócrates, conhecido como o pai da medicina, descreveu uma doença e a chamou de “asma”.1 Este, por sua vez, observou que a enfermidade era mais comum em pessoas que viviam em áreas úmidas e esfumaçadas, e que os sintomas eram aliviados por meio de atividade física e mudanças na dieta.1

No entanto, somente no final do século XIX, os médicos começaram a entender a natureza patológica da asma. Em 1892, um médico austríaco chamado Heinrich von Bamberger publicou um artigo descrevendo a asma como uma doença crônica que envolve inflamação das vias respiratórias e espasmos musculares. Ele também foi o primeiro a sugerir o uso de adrenalina para tratar os sintomas agudos de asma.1

Atualmente, sabe-se que a asma afeta mais de 300 milhões de pessoas em todo o mundo. Ela é caracterizada pela inflamação e estreitamento dos tubos bronquiais, que pode ocasionar uma série de sintomas desagradáveis, como dificuldade para respirar, tosse, chiado no peito e outros.2 Embora não tenha cura, é possível controlar seus sintomas e evitar crises por meio de tratamentos médicos adequados e, sobretudo, mudanças no estilo de vida.3

Os medicamentos para o tratamento da asma podem ser divididos em dois tipos principais: medicamentos para alívio rápido dos sintomas e medicamentos para controle e redução de crises. 

  • Medicamentos de alívio rápido: são usados ​​para tratar crises agudas de asma, agem como broncodilatadores, e podem apresentar ação de curta ou longa duração. Estimulam a dilatação das vias aéreas e devem ser utilizados no tratamento das crises asmáticas. Seus efeitos aparecem em até dois minutos e, no caso dos de curta ação, duram de duas a seis horas, já os de longa ação têm seus efeitos por até 12 horas. Entre eles estão incluídos medicamentos como salbutamol, fenoterol e ipratrópio.4 Esses medicamentos são geralmente administrados por inalação ou nebulização, o que ajuda a levar o medicamento diretamente às vias respiratórias.
  • Medicamentos para controle e redução de crises: são utilizados diariamente para prevenir crises de asma e diminuem a inflamação das vias respiratórias.4 Geralmente são administrados por inalação, mas também por via oral, e incluem corticosteróides (ex. fluticasona, budesonida e beclometasona) em sua composição, que reduzem a inflamação das vias respiratórias, e antagonistas dos receptores de leucotrienos (ex. montelucaste e zafirlucaste), que ajudam a controlar a resposta inflamatória característica da condição.4 Esses medicamentos podem levar semanas para começar a gerar uma resposta no organismo, mas quando usados ​​corretamente, podem reduzir significativamente o número de crises de asma.5

Existem também os medicamentos combinados, que contêm tanto um broncodilatador, quanto um corticosteroide inalatório, como o salmeterol/fluticasona.4 Esses medicamentos são eficazes no controle da asma em pessoas que precisam de ambos os tipos de medicamentos.

As principais características dos medicamentos citados estão descritas no quadro:

É importante lembrar que os medicamentos para asma devem ser prescritos e ter seu uso acompanhado por profissionais especializados. Cada paciente tem um tratamento específico, de acordo com o seu quadro clínico e seus sintomas.5 O uso inadequado dos medicamentos pode agravar a doença e aumentar o risco de crises. Assim, consulte sempre seu médico e farmacêutico de confiança.

Além disso, a prevenção entra como fator crucial para evitar as crises, e ela começa com a adoção de hábitos saudáveis.5 Algumas mudanças simples no estilo de vida podem ajudar a controlar a doença. Veja a seguir algumas dicas para prevenir as crises de asma: 

Em síntese, prevenir é o melhor remédio para a asma.6 Além do uso correto dos medicamentos, a adoção de hábitos saudáveis é fundamental para controlar a doença, sendo assim, sempre que possível pratique exercícios físicos e evite exposição a situações que possam desencadear novas crises, além de informar-se sobre o melhor tratamento disponível para o seu quadro. Com uma combinação de tratamento farmacológico adequado e mudanças simples no estilo de vida, é possível controlar a asma e ter uma vida saudável.7

Referências:

  1. KEENEY EL. THE HISTORY OF ASTHMA FROM HIPPOCRATES TO MELTZER. J Allergy. 1964 May-Jun;35:215-26. doi: 10.1016/0021-8707(64)90004-8. PMID: 14160430.
  2. Vargas Becerra MH. Fisiopatología del asma. Rev Alerg Mex. 2009;56 Suppl 1:S24-8. Rodrigues, Amanda Santos, et al. “Abordagem geral da asma: uma revisão narrativa.” Revista Eletrônica Acervo Médico 1.2 (2021): e9129-e9129.
  3. Bczuska, Juliane Coimbra, and Eduardo Pietruchisnki. “ASMA: UMA         ABORDAGEM FISIOPATOLÓGICA.” Anais do Salão de Iniciação Científica Tecnológica ISSN-2358-8446 1 (2021).
  4.  Silva, Lara Guimarães, et al. “Assistência farmacêutica para pacientes com asma: revisão integrativa.” Revista Artigos. Com 34 (2022): e9451-e9451.
  5. Moura, JAR, Camargos PAMC,  Blic J. “Tratamento profilático da asma.” Jornal de Pediatria 78 (2002): 141-150.
  6. Garcia-Larsen V, Del Giacco SR, Moreira A, et al.. Asthma and dietary intake: an overview of systematic reviews. Allergy. 2016; ;71(4):433-42

Referências do quadro:

  1. ANVISA. Montelucaste de sódio, bulário eletrônico. Publicado em 12 de janeiro de 2022. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351221835201011/
  2. ANVISA. Sulfato de Salbutamol, bulário eletrônico. Publicado em 07 de março de 2022. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351259374201907/
  3. SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL. Salmeterol + Fluticasona. Disponível em: https://www.saude.df.gov.br/documents/37101/532218/Salmoterolfluticasona.pdf/83e1def5-809e-e6cf-6cfe-0c58a806b2df?t=1648998429998
  4. ANVISA. Brometo de Ipratrópio, bulário eletrônico. Publicado em 19 de julho de 2021. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351012052201998/
  5. ANVISA. Budesonida, bulário eletrônico. Publicado em 25 de abril de 2021. Disponível em:  https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351869125201671/
  6. SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL. Fluticasona. Disponível em: https://www.saude.df.gov.br/documents/37101/533483/FLUTICASONA.pdf/c4141509-7138-bef2-23e1-5be6f11958ee?t=1649000858984
  7. ANVISA. Flutivate, bulário eletrônico. Publicado em 15 de março de 2021. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351069436200315/
  8.  MANUAL MSD. Medicamentos para prevenir e tratar a asma. Publicado em março de 2022. Disponível em: https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/dist%C3%BArbios-pulmonares-e-das-vias-respirat%C3%B3rias/asma/medicamentos-para-prevenir-e-tratar-a-asma