Por Raissa Carolina Fonseca Cândido
Em 2006, a Organização das Nações Unidas produziu uma cartilha sob o título: “Drogas não são brincadeira de criança” destacando o importante papel que família e escola desempenham na prevenção do uso de drogas ilícitas por menores de 15 anos.
Hoje, utilizando deste mesmo título escrevo também sobre o uso de drogas por crianças e adolescentes, porém considerando a seguinte perspectiva: até que ponto família e escola têm participação na medicalização infantil, originando um consumo exagerado de drogas lícitas por estes indivíduos?
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma síndrome caracterizada por distração, agitação/hiperatividade, impulsividade, desorganização entre outros sintomas¹ e para Nádia Mara Eidt, “No contexto escolar, a hiperatividade e/ou déficit de atenção apresenta-se como justificativa corrente para o fracasso escolar de um número expressivo de crianças, atribuindo-se a elas a responsabilidade por não aprender e isentando de análise o contexto escolar e social em que estão inseridas”².
Segundo pôster apresentado no 3º Congresso Mundial de TDAH por pesquisadores do Instituto Glia de Pesquisa em Neurociências, USP, Unicamp e o Albert Einstein College of Medicine (EUA), 75% das crianças e adolescentes que usam medicação para o tratamento de TDAH no Brasil tiveram diagnóstico incorreto³.
De acordo com este trabalho, apenas 23,7% das 459 crianças diagnosticadas com TDAH realmente tinham o transtorno e das 128 crianças que faziam uso de Ritalina® para tratá-lo somente 27,3% sofriam com a doença³. Dados estes que se tornam ainda mais alarmantes já que o Brasil é apontado como o segundo maior consumidor de Ritalina® no mundo¹.
O estudo que deu origem ao pôster já citado ainda não foi publicado, contudo de acordo com Prof. Dr. Marco Antônio Arruda, um dos autores do trabalho, “o estudo mostra que a realidade brasileira é de subdiagnóstico e subtratamento do TDAH. Sendo que o excesso de diagnósticos e de tratamento com psicoestimulantes ocorre principalmente nas classes A e B, que não são predominantes no nosso país”.
Sendo assim, é preciso rever o diagnóstico e o tratamento de transtornos como o TDAH e repensar o papel do medicamento nestes tratamentos, considerando que conforme dito pela médica e pesquisadora da Unicamp, Maria Apparecida Moysés “As mudanças que aconteceram na história da humanidade foram pelos questionamentos, sonhos e utopias. Ao medicalizar, estamos abortando um futuro diferente, sem criatividade.”
Referências:
¹ Instituto Paulista de Déficit de Atenção. Acessado em: 27/01/2012. Disponível em: http://www.dda-deficitdeatencao.com.br/tdah/
² Transtorno de Déficit de Atenção/ Hiperatividade e psicologia histórico-social. Nádia Mara Eidit. Acessado em 27/01/2012. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/v40n139/v40n139a07.pdf
³ Are Psychostimulants Overprescribed in Brazilian school-aged children? Marco A. Arruda, Maria Valeriana Moura-Ribeiro , José Hércules Golfeto , Marcelo E. Bigal, Guilherme V. Polanczyk.
(Texto extraído do V.8, n°1 do Boletim publicado em 31/10/11)*.
*As matérias deste número ainda não foram postadas no Blog, em breve vocês poderão ler todo o conteúdo deste nº por aqui.