Aline de Cássia Magalhães
A osteoartrose, também denominada artrose e osteoartrite, é um processo degenerativo com erosão contínua da cartilagem das articulações e uma inflamação secundária discreta, que acomete principalmente as articulações do quadril, joelho e vértebras. Essa condição clínica pode ser assintomática ou apresentar manifestações de dor, restrição de movimentos e até gerar deformações ósseas1. A doença é mais prevalente em mulheres, sendo pouco comum em ambos os sexos até os 40 anos e mais prevalente após os 60 anos de idade. Estima-se que, de maneira geral, cerca de 85% das pessoas com 75 anos ou mais, apresentarão alterações radiológicas e clínicas relacionadas a osteoartrose, sendo 30% a 50% delas associadas a relatos de dor crônica2.
A origem da osteoartrose ainda é desconhecida e até o momento existem algumas hipóteses de mecanismos são descritas na literatura. Porém, já se sabe que o desenvolvimento da doença tem influência de fatores genéticos, bioquímicos, nutricionais, mecânicos e ambientais, dentre eles se destacam a resistência das articulações e a pressão exercida sobre elas, que está relacionada a condições como o peso corporal, uso excessivo de determinadas articulações e outras doenças prévias que as afetem1,3.
Atualmente, alguns tratamentos consistem em fisioterapia e uso de analgésicos e anti-inflamatórios não esteroides (AINEs). Eles buscam o alívio da dor e melhora momentânea da função articular, sem promover mudanças definitivas nas lesões existentes nas articulações, já que ainda não existe um tratamento específico para reverter a degeneração3. Entre as opções medicamentosas, o uso de medicamento a base de sulfato de condroitina e sulfato de glicosamina tem se destacado3,4. Embora estudos in vitro e in vivo indiquem que essa associação tem efeitos anti-inflamatórios e atua na síntese de componentes da cartilagem articular, as evidências disponíveis sobre a eficácia do tratamento são controversas3.
Em uma revisão sistemática que comparou o uso da associação de condroitina e glucosamina com placebo, não se observou diferença significativa quanto à melhora da rigidez articular, da função articular e da dor em estudos de curto (inferiores a seis meses) e longo prazo (seis meses ou mais). Também não houve diferença significativa quanto ao número de eventos adversos, incluindo os de maior gravidade5.
Ademais, o uso da associação de condroitina e glucosamina, comparado ao uso de AINEs, não apresentou diferença significativa na melhoria da função articular ou na ocorrência de eventos adversos em estudos de curto (inferiores a seis meses) e longo prazo (seis meses ou mais). Também não se verificou melhora da dor em curto prazo. As avaliações do uso da associação em curto e longo prazo observaram resultados melhores para rigidez articular, sendo que em longo prazo os benefícios foram mais expressivos. Nos estudos com maior duração, o grupo que utilizou a associação relatou dores em menor intensidade. Os estudos que avaliaram a melhora da dor apresentaram baixa qualidade metodológica e muito diferentes entre si, o que dificultou a obtenção de resultados conclusivos5.
Em uma revisão narrativa da literatura, que incluiu 11 estudos, também foi avaliado o tratamento da osteoartrose nas articulações de joelho e/ou quadril. Os resultados apontam que não há um consenso quanto à eficácia ou não do uso da associação. Entre os estudos que avaliaram esse uso, alguns mostraram efeitos moderados, como melhoria na função articular e menor perda da cartilagem, evidenciando um retardo na progressão da doença. Já outros indicaram que a associação não foi capaz de reduzir a dor e progressão das lesões ou que os resultados positivos eram tão modestos que não apresentavam relevância clínica3.
Além disso, observou-se que muitos dos estudos sobre o uso desses princípios ativos recebeu financiamento da indústria farmacêutica e que aqueles mais bem delineados demonstraram benefícios menores desse uso. Também se ressaltou que mesmo ocorrendo resultados positivos nas lesões de degradação articular, é muito importante avaliar a melhora da dor e da perda funcional, pois um exame radiológico promissor não terá relevância clínica no tratamento se não houve melhoria dos sintomas e da qualidade de vida3. Cabe ressaltar que embora os estudos avaliados tenham sido considerados com delineamento apropriado para avaliar a eficácia dos medicamentos analisados, trata-se de uma revisão narrativa da literatura e a qualidade desses estudos não foi avaliada individualmente. Diferentemente das revisões sistemáticas, as narrativas não possuem uma metodologia definida, a seleção e interpretação dos estudos está sujeita à subjetividade dos autores. Com isso, seus resultados não são indicados para embasar decisões em saúde.
Diante disso, é importante que as evidências disponíveis sejam cautelosamente avaliadas, uma vez que ainda se mostram muito divergentes, antes da escolha pelo uso da associação de condroitina e glucosamina para o tratamento da osteoartrose. No momento da seleção do tratamento e no acompanhamento do paciente, devem ser considerados fatores como redução da dor, melhora na função articular e melhor relação custo-benefício, já que a associação não se encontra na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) e precisa ser adquirida pelo usuário na rede privada. O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza como opções farmacológicas medicamentos como AINEs, corticoides e outros que objetivam o alívio da dor. A escolha pela melhor opção de tratamento para cada caso deve ser realizada em conjunto pelo médico e o paciente3,6,7.
Referências
- Filho GB. Bogliolo, patologia. 9ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016. p. 1500
- Sociedade Brasileira de Reumatologia. Osteoartrite (Artrose) [Internet]. Disponível em: https://www.reumatologia.org.br/doencas-reumaticas/osteoartrite-artrose/
- Junior OVL, Inacio AM. Uso de glucosamina e condroitina no tratamento da osteoartrose: uma revisao da literatura. Rev. bras. ortop. [Internet]. 2013; 48 (4): 300-306.
- Anvisa. Consulta a medicamentos registrados [Internet]. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/q/?substancia=8490&situacaoRegistro=V
- Singh JA, Noorbaloochi S, MacDonald R, Maxwell LJ. Chondroitin for osteoarthritis. Cochrane Database of Systematic Reviews [Internet]. 2015; 1.
- Ministério da Saúde. Relação Nacional de Medicamentos Essenciais: RENAME 2020 [Internet]. Brasília; 2020. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/relacao_medicamentos_rename_2020.pdf
- Ministério da Saúde. Nota Técnica nº 34/2012 [Internet]. Brasília; 2012. Disponível em: https://www.saude.gov.br/images/pdf/2014/setembro/10/Glicosamina-condroitina–atualizada-em-15-10-2013-.pdf